Sunday, May 1, 2016

Dia da Mãe - pela minha mana

"FAZ-ME UM FAVOR
Se ainda tens a tua mãe, faz-me um favor. Deixa o que quer que estejas a fazer neste momento e vai ter com ela. Vai ter com ela já. Se estás longe dela e é mesmo impossível ires ter com ela já, mas só se for mesmo impossível, tipo, não há avião, então pega no telefone e liga-lhe. Faz-me um favor. Liga-lhe. Liga-lhe já. E logo que estejas com ela ou que ela te atenda o telefone, faz-me um favor, diz-lhe sem rodeios que a amas. Que a amas muito. Agradece-lhe. Passa-lhe a mão no rosto ou diz-lhe que não vês a hora de voltarem a estar juntos para o poderes fazer. Faz-me um favor, fala-lhe do fato que te fez para o carnaval de 85, diz-lhe que adoraste e nunca mais te esqueceste dele. Diz-lhe que ninguém, ninguém faz leite creme como ela e que não há em lado nenhum do mundo coisa que te saiba tão bem como a sua sopa. Ela vai dizer-te "pois, mas em miúdo vi-me negra para que a comesses". E tu responde-lhe "obrigado". Faz-me esse favor, diz-lhe obrigado por te obrigar a comer sopa, pelas dores de parto (dói, sabes?, ela toda a vida te disse que não sofreu nada para te ter, que foi um parto santinho, mas sofreu, sabes? Sofre-se sempre para parir). Agradece-lhe as noites em branco, os lanches na mochila, a roupa lavada, o farnel para o passeio, as calças de marca. (Sabes que fez horas extraordinárias para tas poder dar? E que deixou de almoçar algumas vezes?) Faz-me um favor. Diz à tua mãe que a amas e que por mais pessoas importantes que tragas para a tua vida, o vosso amor é especial, é de outra lavra. Se estiveres com ela e não ao telefone, faz-me um favor. Abraça-a. Esmaga-a mesmo. E enche-a de beijos babados e repenicados. Dá-lhe a oportunidade de ser ela a limpar a cara desses beijos, como tantas vezes fizeste na tua estúpida adolescência, quando ela te beijava a ti ("Oh mãe, deixa-me!"). Ela não vai fazê-lo, mas de qualquer modo, faz-me um favor, dá-lhe essa oportunidade. E já agora, pede-lhe desculpa. Pede-lhe desculpa por teres limpado a cara depois dela te ter beijado. E por teres sentido vergonha por ela estar a dançar no casamento do primo Tó. Ela vai-te interromper, vai dizer que não se lembra de nada disso, e não lembra mesmo, porque num coração de mãe não cabem essas coisas. Mas mesmo assim, faz-me um favor, pede-lhe desculpa. E puxa-a para dançar. E vai com ela ver montras. E paga-lhe um café. Diz-lhe que te deste conta do nada que lhe deves a vida e por isso estás ali para o que ela quiser, porque por mais que faças nunca vais poder pagar isso. Já viste? A tua mãe deu-te a vida. Sim, tu, já estiveste dentro dela. Essas grávidas joviais que vês passear na rua, a tua mãe já foi uma delas e eras tu dentro da sua barriga! Faz-me um favor e pergunta-lhe onde vai assim tão bonita. Diz-lhe que ainda ontem a senhora do café te disse que não lhe dava a idade que tem. Faz-me esse favor, fazes? Dando-te conta do abençoado que és, não porque a tua mãe ainda vive, mas porque é a tua mãe! Essa mulher única e extraordinária que te deu vida e que não dormiu três noites para te fazer o fato do carnaval de 85. Antes que seja tarde. Faz-me esse favor, fazes? Faz isso todos os dias."

Ana Luísa da Silva Pereira

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