Sunday, May 15, 2016

Cada um no seu relvado!

     Quando chegámos a Bragança, hoje, pela tardinha, a cidade estava ao rubro. Ao contrário do costume. Os meus conterrâneos não devem saber, mas a capital de distrito do nordeste transmontano, ao fim de semana, desertifica totalmente. Porque os estudantes vão "a casa" e os naturais de cá têm todos raízes nas aldeias circundantes e, então, é aí que passam os tempos livres, em tainadas de alheiras, chouriço e pão regional, com família e amigos. De modo que, nós, os "estrangeirados" temos assim a noção de que habitamos uma cidade fantasma, onde, por vezes nem há onde tomar um café. 
        Porém, não hoje. Com a euforia da bola e sendo a maioria dos brigantinos lampeões, a cidade fervilhava a preparar os festejos. Cafés à pinha, ecrãs escarlates, cachecóis a preceito, brigadas na Rua Sá Carneiro, à espera da hora de fechá-la ao trânsito para as ditas celebrações. 
      Na Catedral, no entanto, celebrações diferentes. Dirijo-me à basílica para assistir ao Crisma de alguns meninos da Casa e de algumas meninas do Lar. Ao encaminhar-me para a porta principal, pela lateral, dou de caras, inadvertidamente, com um velho a urinar contra a parede do edifício. Que adequado, penso. Dá-me vontade de rir. Desvio-me uns metros para não o embaraçar. (como se!)
      Entro, enfim, na igreja. A cerimónia já teve início e o ambiente é de respeito. Logo me envolvo e concentro. Com a idade devo  estar a tornar-me sentimentalóide, porque me comove ver aqueles jovens todos, a passar uma luz, de vela em vela. De repente, isso traz-me assim um misto de orgulho nesta etapa deles e uma esperança no futuro. Penso: "estão tão grandes!". E também: "o futuro é deles, talvez venham a tornar este mundo melhor!". Enfim, deve mesmo ser da idade.
     Depois há um miúdo, mano mais novo, que faz questão de acompanhar o crismado ao altar. Comove-me outra vez o facto. Mas só para no instante seguinte dar com o olhar num marido do banco ao lado, que tenta, o mais discretamente possível, ir assistindo ao seu Benfica, no ecrã do telemóvel, semi escondido, nos folhos do vestido da sua senhora. A vontade de rir dissipa-me a potencial eventual lágrima de comoção da visão fraterna. (Não tenho as emoções reguladas, sou pessoana e múltipla em cada momento, mas psicanálise à parte!)
    O Sr bispo bem tenta pregar, mas o ruído do exterior cresce.  Momento da consagração da hóstia. O silêncio e a introspecção possíveis, ao som das buzinadelas, apupos e vivas lá de fora. O Benfica sagrou-se campeão. Concorrência desleal. Parece-me que hoje há empate: equipamentos 1- batinas1.  
      A mim, a quem o árbitro nunca conquistou,e apesar das apitadelas externas, soube-me bem a pausa, o recolhimento, receber e ser recebida. Saio da igreja em paz. Trago também alegria no coração, apesar de não ter celebrado nenhum golo. São campeonatos diferentes!

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