
Ainda apanhámos um susto, há umas semanas atrás, quando percebemos que a Mary trocava os pês pelos tês e que, para não pensar muito nos ditongos se deitava a adivinhar a palavra pela imagem ou pelo contexto, de forma que previa mãe onde deveria decifrar mamã...
Aquilo andava a pôr-me doida! Um pê e um A, pá; um tê e um ó, tó - e então a rapariga lia PÁ-TÓ. Sápó, rátó, pálitó e por aí adiante. (Ensinei-lhe os diferentes valores das vogais. Disse-lhe que, no final das palavras o O normalmente se lê U e lá foi encaixando aquilo.). Depois era - TAPT, para tapete. Ora, se lhe ensinam que P se lê pê, para quê acrescentar vogais?
A primeira vez que fez um ditado- uma lista com oito palavras - acertou duas e, no dia seguinte teve avaliação amarela na leitura. Foi o alerta para nós. Nunca mais a largámos. Diariamente um pouquinho, mas mais ao fim de semana, exercícios extra de sílabas, palavras e pequenas frases, em fichas, cadernos e até em jogos de computador. Foi progredindo. No ditado seguinte teve as oito palavras correctas e um PARABÉNS a vermelho, que nos encheu o coração e lhe redobrou a confiança.
No outro dia, pega num livro do Valter Hugo Mãe que ando a ler (Desumanização), aprecia-lhe a capa, as ilustrações dos monstros, vira-o, revira-o, folheia-o e conclui: "A mãe já leu isto tudo?". Achei-lhe piada. A noção do esforço gigantesco que será, do ponto de vista dela, juntar aquelas sílabas todas!!!!
Apesar das dificuldades iniciais, sempre considerei muito positiva a atitude dela em relação à aprendizagem. Especialmente no que toca ao sentido de humor e espírito crítico. Lá tinha ela de ler e copiar frases, com as reduzidas consoantes que haviam aprendido e ela a considerá-las (e bem) artificiais e forçadas:
O LEÃO PÕE A PATA. (ponto final)
E ela, depois de muito silabar: "Mas põe a pata aonde, faz algum sentido?"
O PAPÁ PAPA A PAPA.
A sério? Quem come a papa são os bebés!
Sim, Maria, mas tu ainda não aprendeste o bê, anda, copia.
(Faz-me lembrar a minha irmã nas aulas de condução e o instrutor, conduza, menina, não questione, não questione!)
A DÁLIA DÁ O DEDAL AO DIDI. O que é dedal, mãe?
O PAI É O PAPÁ...
Não! Ia ser mamã...
Enfim, pareceu-me que a curiosidade e o espírito crítico da Maria podem vir a ser uma mais valia na aquisição de conhecimentos. Para já, porque tem de ser, coartamo-los para que avance, mas com um sorriso nos lábios. Como se diz por estas terras "é guitcha" (esperta).
Hoje, com uns materiais manipuláveis em cartão, a surpresa. Junta tudo, mesmo letras que ainda não deu. Leu tudo: Xavier, Beatriz, árvore, etc, etc. Encarreirou. Agora faz-nos desenhos com mensagens:
A mãe é má.
O pai é mau.
O quê, safada?É para isto que andas a aprender a escrever?
Ah, é que ainda não dei o bê de bom!
No comments:
Post a Comment