Thursday, May 18, 2017

De Mandinho a Bu Mando

     O BU MANDO dá biberão e papa e muda fraldas!

     Do Mandinho (o benjamim tardio e pré-menopausico de uma prol de treze) até ao BU MANDO há uma distância abissal. Temporária e identitária também.


     Mandinho, nado, criado e mimado por uma dúzia de braços carinhosos de manas mais velhas, era o antípoda do BU Mando.
      Ou, pensando melhor, é por ter sido tão mandinho que ele agora cuida tão bem e é tão bom BU Mando!!!Mas levou certas décadas um certo tempo a mudar...
      A minha mãe ainda adoptou o Mando,  mimou-lhe as esquisitices gustativas, que não tolerava manteiga, que nem provar queijo, nem natas, que não sou apreciador de marisco, nem de cogumelos, que não gosto de molhos esquisitos, nem temperos nem eteceteras que já não me lembro.
       As peúgas dobradas de uma forma como nunca mais vi em casa nenhuma (juro que youtubei = fui ao youtube e cusquei tudo o que é tutorial de como dobrar peúgas para vos mostrar a forma como fazíamos com as dele, contudo não encontrei). Era mágico! Depois de umas quinhentas mil voltas as peúgas ficavam espalmadinhas, alisadinhas e prontas-a-calçar. O Mandinho só tinha de enfiar o delicado pezinho e erguer metade da peúga até à canela. Esticadinhas. Mesmo com calções curtos. E com raquetes desenhadas. (desculpa paizinho, teve de ser!)
      Mais de resto, o Mando era o que se pode dizer de um bom marido... à época, vá!
Não "ajudava em casa" como a maior parte dos homens da geração dele, mas gabava-se de fazer uma cama na perfeição, tal como tinha aprendido nos pára-quedistas, onde passavam a revista, ao que dizia, de régua e esquadro. Apesar das geometrias, nunca o vi fazer nenhuma! Revistas, sim, fazia. Ao chegar a casa, sábado pela tardinha, com o dedinho nas prateleiras, a ver se tínhamos limpo bem o pó... ("sostras" era quando falhávamos a prateleira de cima!!!)

Nada faria prever o avô que ali se estava a incubar!

O meu pai, o homem a quem na praia tínhamos de chamar tio Mando, TIO, repito. A ver se me explico: Tio mando era como eu e a minha mana, na altura gaiatas, tínhamos de chamar pelo nosso PAI. Que era para não estragar os micos. Melro!

Depois, crescemos e deixámos de lhe chamar Tio. Sabem aquela história dos pais (homens) comprarem uma espingarda quando a primogénita entra na puberdade? Pois bem, não foi preciso. O meu pai , O Pai Armando,  tinha o álbum dos paraquedistas. Era com isso que ele afugentava a caça. Cada vez que um amigo nosso ia lá a casa, tinha que gramar com o álbum da tropa, todo a preto e branco e carregadinho de recordações para contar!

O Pai Armando era um homem esquisito e exigente. Ao vir da praia, obrigava-nos a limpar as areinhas dos pés antes de entrar no carro, "dedo por dedo". Também, a verdade, é que ele dizia que não vendia carros, mas automóveis. Por isso, esse era o preço a pagar por viajar em viaturas de luxo!
Era um homem esquisito, sim, metódico, que tinha as gavetas milimetricamente arrumadas e que se passava com a nossa desordem juvenil. E quando lhe púnhamos a mão no ombro, à mesa, "cheias de gordura, pá!"

Raramente comíamos chiclets para não engolir e porque fazia mal aos dentes.
Não podíamos beber refrigerantes, nem nas festas, quando os primos todos estavam a enfrascar Coca-Cola. "Águinha, para as meninas!" ;
nem comer gelados de gelo (só dos de leite!);
nem andar descalças;
nem com a cabeça ao sol;
 e tínhamos de esperar três penosas horas algarvias para fazer a digestão e ir ao mar...
Não podíamos mexer na vitrine dos carrinhos,
nem tocar na guitarra eléctrica para não estragar.

É o que eu digo: nada faria prever o avô que ali se estava a incubar!

Hoje em dia, e ainda bem, os netos:
fazem grandes concertos a seis mãos na salinha da música da casa do Bu Mando;
bebem o Ice Tea que lhes apetece
e não estou certa que ele consiga controlar tanta mão para desengordurar!
Nem que ainda se importe tanto com isso.

Justiça seja feita, vá.
O Bu Mando já estava a ser incubado quando nos ensinou a nadar e a andar de bicicleta e a gostar de boa música e de filmes antigos; nos serões a tocar orgão ou viola ou harmónica; nas tardes a ressonar no pinhal para a gente brincar em bando com os primos; ou no Santuário do Sameiro, com o capot aberto e o relato da bola a metralhar, enquanto eu e a Ana andávamos de baike pelo recinto.
Com o que evoluiu entretanto, eu até acho que, se nós nascêssemos agora, o bu mando era capaz de ser pai para nos mudar fraldas.

Grande Bu Mando!