Monday, November 21, 2016

Dentista


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Hoje o Pedro foi à dentista. Queixava-se de um dente "rachado" havia já uns dias.
Ele entra bem disposto, descontraído, conversa com a doutora e a auxiliar, abre a boca quando solicitado.
A Dra analisa e dispõe-se a explicar-lhe de que se tratava e qual o procedimento a seguir.
Ele muito despachado: "Não quero saber de nada disso, esteja à vontade, faça lá o que tiver de fazer e pronto!" (eu meia na dúvida entre achar piada  à descontração ou censurar a pontinha de desrespeito que me pareceu interrompê-la assim abruptamente, mas vá lá, são crianças e tal, a gente tolera...)
Ainda assim a Dra foi explicando que era uma cárie e que tinha efectivamente uma rachadelazita, que teria de limpar e afundar... (suponho que a seguir diria para depois tapar, se tivesse tido tempo).
O Pedro volta a interrompê-la e sai-se com:
"Então você em vez de tapar o buraco vai abri-lo mais?"
Riram-se, que em anos de carreira nunca tinham  tido uma saída assim.
Desta vez também perdoei a audácia pelo sentido de humor. 

Tuesday, November 15, 2016

Dar a outra face


Resultado de imagem para turning the other cheek, clipart      Ó Jesus Cristo, se calhar,  hoje em dia, não era mal pensado tu reveres aquela parte de dar a outra face e tal... é que as coisas estão difíceis, nos recreios infantis e começa a urgir um qualquer tipo de inovação, mais não fosse tecnológica, sei lá... Um holograma tipo bolha virtual que protegesse os garotos dos arremessos violentos dos pares. Não sei, mas estou aberta a negociações ou mensagens espirituais por vias de pombas santas ou emails. Dá-me igual.           Não leves a mal, eu sei que foi isso que me ensinaste e que tentei passar à prole, mas, quer dizer... será melhor já não insistir no oferecer literalmente a segunda bochecha ao estalo, é que os meus filhos têm vindo um pouco mazelados da caridade e perdão intervalar...
      No outro dia, o Pedro vinha perturbado e não queria ir ao treino de futebol (que ele adora e de que nunca abdica). Indaguei razões e o pacto de silêncio que encobre estas circunstâncias impôs-se. Casualmente uma professora dele vinha a passar e explicou-me detalhes. Tecidos muitos elogios à boa educação e cordialidade do Pedro, um comportamento exemplar dentro e fora da sala de aula, enfim, arrufos entre meninos que até se dizem amigos, uma má companhia para o Pedro, no seu entender, desavenças que acabam em bulhas nas quais o meu filho não riposta.  Esta parte deixou-me confusa. Que não procurasse o confronto, que tentasse lidar civilizadamente, eu entendia.  Agora, que depois da agressão não se defendesse sequer, tendo em conta a estatura muito inferior do outro menino... não estava a perceber. Perguntei-lhe, a sós. Confessou-me: "Não quero ser chamado à direcção, nem ser expulso da escola, nem que me ponhas de castigo por bater nos outros." 
       Naquele momento, sentimentos confusos. Orgulho na opção dele. De não violência. A percepção - tão rara- de que estamos a educá-lo bem, para a civilidade e o respeito pelo outro e também o respeito pelas instituições e todo o sistema com as suas regras. A surpresa de perceber o quanto respeita a autoridade exterior a si. Mas também sentimentos azedos como: surpresa por vê-lo no papel de vítima (embora não o quiséssemos como agressor); pena por lhe ter passado tão bem a mensagem que ficou indefeso; comoção pela lealdade e não denúncia do amigo; raiva por um recreio que não controla estas situações; culpa por não lhe ter ensinado também a  defender-se... deu-me que pensar!
      A Mary, por sua vez, entrou na escolinha dos grandes, uma escolinha pública onde brinca no recreio com meninas e meninos de todas as formas e feitios. Tem vindo com arranhões e hematomas vários, que inicialmente atribuímos às brincadeiras audaciosas da nossa despenteada, que sempre foi destemida e aventureira. Pouco a pouco, relatos de agressões. Começámos com o discurso caseiro do "tu também não és flor que se cheire" e por aí vai, mas temos vindo a reparar que o problema é mais vasto que isso. Sondámos o mano mais velho, quase em vão, porque logo percebemos que os seus recreios estão mais focados em remates e defesas do que em ser cavaleiro-andante-escudeiro da piquena. Nas palavras dela "ele nos intervalos está sempre  a jogar futebol!"
      Hoje, na mochila dela, um grande pau. "Isto é o que eu uso para me defender!" Fiquei sem pinta de sangue, veio-me logo à ideia a minha mana mais nova que foi agredida exactamente na escola primária e com um pau, chegando a ser  e suturada! Comecei a remoer na ideia que os intervalos são o Texas, não há funcionários que cheguem para tantas crianças com as hiperactividades e faltas de educação que elas trazem anexas e, portanto,... valha-nos Deus!
      Peço-lhe que não recorra ao pau, nem a pedras, nem a nada, nem mesmo para se defender; sugiro-lhe alternativas como aproximar-se de um adulto, fazer queixa a um funcionário ou à professora. Parece que também há adultos que os mandam "defender-se em vez de fazer queixinhas".
      Ora bem, valha-nos Deus e desculpa lá ó Cristo, mas manda-me rápido uma pomba iluminada que me inspire ou não tarda e já os instruo de maneira diferente: sabem, filhos, afinal, dar a outra face só mesmo se for para beijar!