Thursday, April 7, 2016

"E se fosse eu?"

Eu sei que não é por mal.
MAS.

As pessoas perdem a noção. Agora andamos a brincar aos refugiados. Oferecemos mochilas nas escolas e pedimos às criancinhas que enfiem lá o que lhes pareceria relevante se tivessem de abandonar as suas casas. É pá! Menos. O que vale é que, certamente, por essas salas de aula fora estão centenas de profissionais competentes, moderados e razoáveis que souberam manobrar o circo e chegar à essência da questão com os miúdos, aproveitando a deixa para conversar sobre sofrimento, dignidade humana, integração e tolerância. Como se viu, aliás, pelas palavras dos miúdos nas peças televisivas. Discursos já muito bem estruturados e coerentes, a denunciar o trabalho dos colegas - que estas coisas raramente vêm de casa. Bem hajam, colegas. Ao menos isso.

Se a experiência socializóide ainda se fizesse com adolescentes, talvez não me repudiasse tanto. Apesar de tudo é outra fase de maturação. Presta-se ao acto de reflectir. Emerge o pensamento filosófico, o espírito crítico está ao rubro. Os adolescentes tendem a ser, a um tempo, extremamente egocêntricos e solidários - portanto, me parece, terreno fértil para este tipo de incubações pseudo-socio-pedagógicas... (suspiro!)

 É que na infância, não sei, parece-me violento. ESCUSADO. A gente em criança tem é de brincar, acreditar em magia e fadas e duendes,  ter amigos imaginários e inventar canções e palavras só nossas. Infância é ilusão. A realidade tem outro tempo. 

Não é fugir aos problemas. Se eles perguntarem a gente responde. É poupá-los à dor, enquanto for possível. Ou então não se admirem de os ver brincar, como eu vi, ao "ataque às Torres Gémeas". É arrepiante, mas é talvez o preço a pagar pelo que considero ser a adultização abusiva da infância.

E depois o senhor ministro a explicar aos meninos do primeiro ciclo que levava as chaves de casa, que era muito importante nunca nos esquecermos das chaves de casa. Qual? A dos refugiados? A que foi bombardeada e da qual só restam escombros?A que sucumbiu a fogo e guerrilha? Ou a do abrigo que já tinham arranjado nos destroços de um outro edifício semi derrubado numa outra cidade em que se refugiaram? Ou será a chave para a tenda no campo de refugiados?
Tive que ir ouvir de novo para acreditar. Uma peça cortada, frases tiradas do contexto, nunca se sabe. Então o senhor dizia que levava a chave para carregar o sonho de um dia regressar. Nem assim. Não me parece que o simbólico jogue com o estádio mental destas idades do concreto, mas posso estar errada. 

Caríssimos psis, pronunciem-se. Quanto a mim...é pá! Não! Há uma idade para tudo. 

E. por fim, desagrada-me ainda que a mensagem seja camufladamente direccionada aos pais. A usar os miúdos para educar os pais. Como se. Enfim.

Para além do mais, "children see, children do". As crianças fazem o que vêem fazer.
Não o que se lhes diz.
Adianta muito chegarem a casa de mochilinha às costas, a mochilinha cheiiinha de boas intenções, para levarem com o chorrilho de impropérios que o povo (a galope da propaganda de certos posicionamentos ideológicos extremistas) profere. Na onda do "ajudar os que vêm de fora e os de cá nada" ou "querem-se infiltrar para nos destruir" etc, etc, etc

As crianças terão empatia, se virem os outros a demonstrar empatia. Solidariedade. Tolerância. Em cada gesto à sua volta. Para com cada ser humano. O resto, a meu ver, é forçado e pouco produtivo.

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