É o clássico, incontornável tema que enche os corações das professoras primárias, no seu romântico afã de nos aproximar da natureza e do ciclo da vida! Aposto, que por esse país fora, rios de tinta em canetas seguras por dedos pequeninos, metros de linhas em cadernos de deveres, ilustrações pueris com florzinhas e gaivotas a rasgar céus azuis. Borboletas volteando, abelhas a zunir, caracóisitos com os corninhos ao sol.
"Eu gosto muito da primavera e do sol a brilhar". Eu também! Ainda hoje passei uma tarde esplêndida a fazer a fotossíntese esparramada numa manta sobre a relva.
Só que, para mim, primavera rima com alergias, espirros, dores de cabeça, tosse e noites sem dormir por causa desta. E também rima com tempo incerto, sai-se com chuva, entra-se com sol, ou pior, ao contrário, e, sem contar com ela é molha e constipação certa.
Quando eu era pequenina a primavera era, realmente, tudo flores. Quer dizer, não havia nada de negativo que surgisse na minha cabeça ao pensar na chegada desta amiga estação do ano, ainda por cima da família - a prima (Vera).
Esta era a altura de voltar à manga curta e sentir a liberdade dos braços nus, todo o inverno amordaçados, era uma sensação fabulosa sentir a pele, a luz na pele, a brisa na pele, parecia que nos tinham tirado de um colete de forças!
O mesmo se passava com o calçado! Era tirar as botas fechadas para os clássicos sapatos de verniz na Páscoa, depois talvez umas sabrinas tímidas e, finalmente, os dedos ao léu, o peito do pé exposto, as areias a entrar, a fivela que arranha, o pé que "respira"!
Era altura de sairmos de casa, andarmos soltas como cabritas aos pulos no monte, andar de bicicleta, esfolar os joelhos magrinhos na calçada e comer gelados de leite, em dias de sorte. A primavera sabia a amêndoas, cheirava aos malmequeres desabrochados no Jardim de Santa Bárbara e tinha a luz alaranjada dos entardeceres que se prolongam. Era bom vir do colégio e ainda ser dia. Jantar com a luz do sol. Ter mais horas para brincar.
Era altura de sairmos de casa, andarmos soltas como cabritas aos pulos no monte, andar de bicicleta, esfolar os joelhos magrinhos na calçada e comer gelados de leite, em dias de sorte. A primavera sabia a amêndoas, cheirava aos malmequeres desabrochados no Jardim de Santa Bárbara e tinha a luz alaranjada dos entardeceres que se prolongam. Era bom vir do colégio e ainda ser dia. Jantar com a luz do sol. Ter mais horas para brincar.
Não sei a partir de que idade a prima se zangou comigo. Começou a trazer-me bolhinhas na pele, que me fazem comichão. Diz que a culpa é do marido, o sol. Que, não contente com isso, também me faz enxaquecas e rugas na cara.
De maneiras que, gosto muito, mas zango-me com ela. A prima, vera.
Só que ela, em jeito de partida matreira, faz romper as plantas nos vasos que tenho na varanda, não obstante toda a minha negligência de cuidados, para me lembrar que o ciclo da vida se cumpre, mesmo que eu esteja distraída.
E, como oferenda singela,
para que me lembre dela
a vera manda-me uma andorinha alojar-se, todos os anos, na conduta da casa de banho; de tal forma que, cada vez que tomo um duche, escuto as crias no ninho, acima da minha cabeça, no respiradouro de um primeiro andar! Piu! Piu! Piu!