Monday, April 25, 2016

A minha composição sobre a Primavera!

É o clássico, incontornável tema que enche os corações das professoras primárias, no seu romântico afã de nos aproximar da natureza e do ciclo da vida! Aposto, que por esse país fora, rios de tinta em canetas seguras por dedos pequeninos, metros de linhas em cadernos de deveres, ilustrações pueris com florzinhas e gaivotas a rasgar céus azuis. Borboletas volteando, abelhas a zunir, caracóisitos com os corninhos ao sol.
     








       "Eu gosto muito da primavera e do sol a brilhar". Eu também! Ainda hoje passei uma tarde esplêndida a fazer a fotossíntese esparramada numa manta sobre a relva. 

      Só que, para mim, primavera rima com alergias, espirros, dores de cabeça, tosse e noites sem dormir por causa desta. E também rima com tempo incerto, sai-se com chuva, entra-se com sol, ou pior, ao contrário, e, sem contar com ela é molha e constipação certa.
      
     Quando eu era pequenina a primavera era, realmente, tudo flores. Quer dizer, não havia nada de negativo que surgisse na minha cabeça ao pensar na chegada desta amiga estação do ano, ainda por cima da família - a prima (Vera). 
      Esta era a altura de voltar à manga curta e sentir a liberdade dos braços nus, todo o inverno amordaçados, era uma sensação fabulosa sentir a pele, a luz na pele, a brisa na pele, parecia que nos tinham tirado de um colete de forças! 
      O mesmo se passava com o calçado! Era tirar as botas fechadas para os clássicos sapatos de verniz na Páscoa, depois talvez umas sabrinas tímidas e, finalmente, os dedos ao léu, o peito do pé exposto, as areias a entrar, a fivela que arranha, o pé que "respira"!
       Era altura de sairmos de casa, andarmos soltas como cabritas aos pulos no monte, andar de bicicleta, esfolar os joelhos magrinhos na calçada e comer gelados de leite, em dias de sorte. A primavera sabia a amêndoas, cheirava aos malmequeres desabrochados no Jardim de Santa Bárbara e tinha a luz alaranjada dos entardeceres que se prolongam. Era bom vir do colégio e ainda ser dia. Jantar com a luz do sol. Ter mais horas para brincar.

      Não sei a partir de que idade a prima se zangou comigo. Começou a trazer-me bolhinhas na pele, que me fazem comichão. Diz que a culpa é do marido, o sol.  Que, não contente com isso, também me faz enxaquecas e rugas na cara. 
      De maneiras que, gosto muito, mas zango-me com ela. A prima, vera. 
     Só que ela, em jeito de partida matreira, faz romper as plantas nos vasos que tenho na varanda, não obstante toda a minha negligência de cuidados, para me lembrar que o ciclo da vida se cumpre, mesmo que eu esteja distraída.
      E, como oferenda singela, 
      para que me lembre dela
     a vera manda-me uma andorinha alojar-se, todos os anos, na conduta da casa de banho; de tal forma que, cada vez que tomo um duche, escuto as crias no ninho, acima da minha cabeça, no respiradouro de um primeiro andar! Piu! Piu! Piu!
     

Monday, April 11, 2016

Ana

Eu tenho uma irmã. 
Transtornou a minha vida desde a noite em que nasceu, de madrugada, e eu fui arrancada de pijama para casa da minha avó, "porque o mano ia nascer". Roubou-me o monopólio parental, a hegemonia do quarto e usurpou-me os brinquedos, "deixa lá que é pequenina". Bem queria arreliá-la, pregar-lhe uns sustos à socapa, mas não se podia "porque tinha um sopro no coração", fosse lá isso o que fosse, que para os meus quatro aninhos só significava impunidade nas brincadeiras e supremacia familiar. E à mesa, um exemplo alimentar para a franganinha que não segurava as meias calças e tinha falta de apetite crónica, "põe os olhos na tua irmã". E eu punha. Sempre pus. Ainda ponho. Porque a minha irmã me devolveu em dobro tudo o que então sentia ser roubado, hoje é (quase) tudo o que tenho, a minha outra metade, um ponto de luz na terra, uma força, uma energia inigualável. Põe os olhos na tua irmã, que sempre ultrapassa as expectativas. Veio menina, mais do que eu esperava e do que os astros do tio astrólogo haviam previsto (até baralhas as estrelas ficava bem aqui, mas a verdade é que o astrólogo também era meio fajuto). És a menina que não chega a casa, depois da escola, pois com sete anos apanha um autocarro para ver o colega doente, na outra ponta da cidade. És a adolescente que sobressai no grupo dos rapazes, não apenas pelas razões óbvias (por seres linda e radiante), mas por dominares temas como chassis e cilindradas, de carros e tractores! És a estudante que custeia o seu próprio curso e, no fim, embarca para África (e não é para nenhum SPA). És a mana da praia, de Taizé, da manta no sofá a ver o Alf, do ballet, da patinagem e do ginásio, das cartas com a avó, das escondidas com a Saga, dos bolos (sim TAMBÉM eras tu quem fazia os bolos), das cantorias a lavar a loiça (ganha quem primeiro descobrir o acorde) e do cesto a subir e a descer para a vizinha. És a mana que escuta, mais do que se queixa. És a gargalhada aberta, quase sem que eu termine a piada. És minha mana,Mico, Lana, Iana. BYS sys.

Saturday, April 9, 2016

A eficácia do anti-rugas

    

      Cá em casa não temos muitas frescuras com cosméticos, champôs, pastas de dentes  e  afins. Impera o critério da funcionalidade. Serve? Serve! 
      Por exemplo, o creme facial hidratante. Recuso-me a pagar um balúrdio por marcas que nos prometem a eterna juventude, que, sabemos, não existe. Além do mais, mesmo os mais caros fazem experiências em animais, por isso prefiro pagar menos e assim premiar com menos lucro a maldade das grandes corporações do ramo. Acresce o facto da Deco ter eleito este Cien como o melhor produto do mercado, entre 15 testados.
      Por tudo isso, cá em casa usámos todos o mesmo creme hidratante, um anti-rugas que vale menos de quatro moedas de euro e que se vende no LidEl. E serve muito bem. Hidrata, ninguém faz alergia e pelo menos num dos membros da família cumpre o que promete: garanto-vos que não se vê nem uma rugazinha na face do Pedro!
      Na Mary ainda não testámos o dito cujo devido ao facto dela preferir frascos  cor de rosa e com cheirinho, o que ainda não aconteceu por desleixo. (Não vai ser difícil de resolver. Compra-se o boião uma vez e vai-se atestando de marcas brancas na mesma!!!). Por enquanto, não usa nenhum. Pelo que se comprova que sem o usar funciona na mesma ou ainda melhor, porque ela é, sem dúvida, a que tem a pele mais lisinha do agregado!



(Post Scriptum: Se a minha mãezinha lesse esta crónica tinha, claro, uma apoplexia. Desculpa, mom, já sabes que nunca te chegarei aos calcanhares...)

Thursday, April 7, 2016

"E se fosse eu?"

Eu sei que não é por mal.
MAS.

As pessoas perdem a noção. Agora andamos a brincar aos refugiados. Oferecemos mochilas nas escolas e pedimos às criancinhas que enfiem lá o que lhes pareceria relevante se tivessem de abandonar as suas casas. É pá! Menos. O que vale é que, certamente, por essas salas de aula fora estão centenas de profissionais competentes, moderados e razoáveis que souberam manobrar o circo e chegar à essência da questão com os miúdos, aproveitando a deixa para conversar sobre sofrimento, dignidade humana, integração e tolerância. Como se viu, aliás, pelas palavras dos miúdos nas peças televisivas. Discursos já muito bem estruturados e coerentes, a denunciar o trabalho dos colegas - que estas coisas raramente vêm de casa. Bem hajam, colegas. Ao menos isso.

Se a experiência socializóide ainda se fizesse com adolescentes, talvez não me repudiasse tanto. Apesar de tudo é outra fase de maturação. Presta-se ao acto de reflectir. Emerge o pensamento filosófico, o espírito crítico está ao rubro. Os adolescentes tendem a ser, a um tempo, extremamente egocêntricos e solidários - portanto, me parece, terreno fértil para este tipo de incubações pseudo-socio-pedagógicas... (suspiro!)

 É que na infância, não sei, parece-me violento. ESCUSADO. A gente em criança tem é de brincar, acreditar em magia e fadas e duendes,  ter amigos imaginários e inventar canções e palavras só nossas. Infância é ilusão. A realidade tem outro tempo. 

Não é fugir aos problemas. Se eles perguntarem a gente responde. É poupá-los à dor, enquanto for possível. Ou então não se admirem de os ver brincar, como eu vi, ao "ataque às Torres Gémeas". É arrepiante, mas é talvez o preço a pagar pelo que considero ser a adultização abusiva da infância.

E depois o senhor ministro a explicar aos meninos do primeiro ciclo que levava as chaves de casa, que era muito importante nunca nos esquecermos das chaves de casa. Qual? A dos refugiados? A que foi bombardeada e da qual só restam escombros?A que sucumbiu a fogo e guerrilha? Ou a do abrigo que já tinham arranjado nos destroços de um outro edifício semi derrubado numa outra cidade em que se refugiaram? Ou será a chave para a tenda no campo de refugiados?
Tive que ir ouvir de novo para acreditar. Uma peça cortada, frases tiradas do contexto, nunca se sabe. Então o senhor dizia que levava a chave para carregar o sonho de um dia regressar. Nem assim. Não me parece que o simbólico jogue com o estádio mental destas idades do concreto, mas posso estar errada. 

Caríssimos psis, pronunciem-se. Quanto a mim...é pá! Não! Há uma idade para tudo. 

E. por fim, desagrada-me ainda que a mensagem seja camufladamente direccionada aos pais. A usar os miúdos para educar os pais. Como se. Enfim.

Para além do mais, "children see, children do". As crianças fazem o que vêem fazer.
Não o que se lhes diz.
Adianta muito chegarem a casa de mochilinha às costas, a mochilinha cheiiinha de boas intenções, para levarem com o chorrilho de impropérios que o povo (a galope da propaganda de certos posicionamentos ideológicos extremistas) profere. Na onda do "ajudar os que vêm de fora e os de cá nada" ou "querem-se infiltrar para nos destruir" etc, etc, etc

As crianças terão empatia, se virem os outros a demonstrar empatia. Solidariedade. Tolerância. Em cada gesto à sua volta. Para com cada ser humano. O resto, a meu ver, é forçado e pouco produtivo.