Thursday, August 27, 2015

Era uma vez duas gémeas que celebravam o aniversário em dias diferentes


Era uma vez duas gémeas que celebravam o aniversário em dias diferentes. (Dito assim provoca-me o riso!) Uma no dia de nascimento, outra, por amor, no dia em que foram registadas. De maneiras que arranjavam forma de comemorar a dobrar, comer mais bolo e tagarelar com dois dias de distância. Também era pretexto para repetirem o café na Brasileira, quatro cafés de saco, quatro bolos de arroz e oito cigarrinhos bem partilhados.
Era uma vez duas gémeas que celebravam o aniversário em dias diferentes, com o imperativo para todos nós familiares e amigos de que nos lembrássemos das duas datas, sob pena de amuo e chantagem emocional. Demasiado tarde era porque "eu já tinha nascido há dois dias". Cedo de mais era porque "o que conta é o que está no papel". E, pronto, jogavam assim com a vida e com a idade, mandando no tempo como mais ninguém.
Essa era apenas a primeira das maravilhosas diferenças que as uniam. Uma era sapatos rasos, a outra "pirulitos"; uma cortes curtos e modernos, outra cabelos longos e clássicos, uma saias curtas, outra vestidos compridos. Uma alta, outra pequena. Uma - filhos, chuteiras e emissões de rádio caseiras, outra – filhas, sapatos de ballet e barbies para pentear. 
Juntas…não se podia. Era riso até às lágrimas, às vezes sem quase terem de falar. A "empiscarem" o olho do riso, a quererem construir frases que não saiam abafadas pelos soluços. “Mas de que é que vocês se estão a rir?” Desabavam na gargalhada, sem conseguir explicar. 
Depois era a cumplicidade, a falarem por meias palavras “faz lembrar a outra”, “como daquela vez”, “lembraste do…”… e nós a Leste, sem referentes para seguir o fio à meada. 
E a mais alta sempre a cutucar o braço da irmã com aquelas unhas enormes de felina. “ó mulher chega-te para lá, pára com isso que me magoas, eu estou-te a ouvir”. Mas a mais alta não, nem sempre ouvia, e então a irmã segredava-lhe verdades inconfessáveis, meia aos berros, meia a falar para dentro, uma a abrir muito a boca para se fazer entender, a outra a abrir muito os olhos para entender, e lá se entendiam, profundamente, umas vezes com mais paciência outras com falta dela, muitas vezes com finais de conversa novamente à gargalhada pelos mal-entendidos provocados. 
De linha e agulhas na mão desfiavam alegrias e tristezas enquanto os filhos brincavam junto ao aquecedor, a ouvir a chuva lá fora. (Chovia mais naquele tempo, não era? Seria para estarmos assim tão quentinhos juntos?) Também das mãos delas: as pantufas de lã colorida (como duendes) que aqueciam os pés pequenos e a marmelada ou geleia para barrar na rosca quentinha.
As gémeas que iam à praça, primeiro a pé, depois – novidade – a carta, o carro, a emoção, a aselhice, o nervoso miudinho. “Ó mulher não me enerves” 
As gémeas que iam à praça, ao cabeleireiro, à peregrinação juntas. E que, juntas, embarcavam em aventuras inenarráveis. Só quem as conhece. O dia da invasão dos aliens. O dia em que se barricaram na Sé de Braga, nada mais nada menos que na Sé de Braga, a catedral, impedindo a entrada dos fiéis, das fervorosas fiéis para a missa matinal... O dia em que, elas próprias, fervorosas fiéis em oração no santuário de Fátima, rompem o silêncio devoto com o palavrão exclamado pela cera a arder!
Era uma vez duas gémeas que não celebravam o aniversário no mesmo dia, teimavam em contrariar-se e se completavam na perfeição. Gémeas por dentro na alegria, na energia, na capacidade de trabalho, na força de viver. A mesma generosidade na ajuda aos outros. O mesmo sentido de humor. A mesma paixão pelos filhos. A mesma GARRA. 
Parabéns gémeas! Hoje e daqui a dois dias, como preferirem. Vocês são modelos de mulher para mim!

Sunday, August 16, 2015

Há aqui bolinhaaaaas!

Há um mês atrás comprei um biquíni brasileiro e comi quatro fatias de pizza no mesmo dia. Na altura achei que havia aqui algum tipo de incongruência. Hoje acho que não. Pensei nisso e deu-me vontade de rir, ao comer uma bolinha de Berlim de alfarroba ENQUANTO lia a Women's Health. É que, neste poderoso cartapácio de iluminação espiritual, li, algures, que "os corpos de verão se conquistam de inverno".  Então lembrei-me de todos os treinos que fiz nos dias frios brigantinos, lambi os bigodes de açúcar da dita bolinha que, fiquei também a saber, equivale a 600 calorias e refastelei-me um pouco mais na cadeira ao sol, a gozar da minha exceção à perseverança e método que me guiam durante o inverno. Pensei também que isto era um brilhante passo em frente na minha mente a preto-e-branco-tudo-ou-nada. Pelo sim, pelo não, ainda não estriei o biquíni brasileiro!
Os homens das bolinhas varejam as praias à procura de negócio. Coisa mais contra-natura: vender bolos gigantes, fritos e com creme sob um sol tostante, quem diria que era ideia de negócio... se ainda fossem gelados, bebidas frescas, fruta ou mesmo coxas de frango, dir-se-ia que vendia, mas assim, vá-se lá entender a mente humana. A verdade é que a fórmula funciona há bons anos e prospera. Com tradição e inovação. Este ano a iguaria está disponível com recheios que vão do morango à nutela e nas variedades de alfarroba, com e sem creme, como as tradicionais. Variam também no tamanho: bolas XL... o céu é o limite! A mim, que nem sou muito gulosa, essa parafernália passa-me ao lado. Encantam-me os pregões. "Tenho aqui duas bolinhas..." grita o homem para gáudio e respostas apicantadas dos veraneantes. "Uma com creme, outra sem creme!!!"
Em quinze dias de férias rendi-me uma só vez a esse sabor da infância, que - vá-se lá explicar porquê - sabe melhor se viermos molhados, com o sal nos lábios e os olhos a piscar da luz do sol e do excesso de sal. Fecho os olhos. Volto a ser filha, a ter oito anos e a bolinha sabe a pais que abrem exceções para nos ver sorrir. Abro os olhos. Volto a ser mãe e mulher. Quebrar as regras é tão importante como defini-las, só que quebrá-las é mais doce!